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Pe. Jorge Vilaça | 28 Jun 2018
Embondeiros que sonham pássaros
Pe. Jorge Vilaça, CMAB
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1. Há pessoas que são como lugares bem situados. Transmitem o que crêem sem (ab)usarem da palavra nem reclamarem notícia. Tudo neles é dom. Vivem a nu, para quem quiser vê-los, para quem quiser lê-los. Não buscam simpatias (nem são particularmente simpáticos) e, talvez por isso, não chegam a ser nomeados. Homens que lembram aqueles embondeiros africanos (ou d’ “O principezinho” de Exupery), sólidos por fora, albergues por dentro. Uns e outros tão largos que podem servir de abrigo, de celeiro ou de sepultura. E até há quem diga que, o embondeiro-árvore é capaz de armazenar dentro de si 120.000 litros de água.

2. João Gonçalves, nascido em Pombal, esteve quase 40 anos como irmão missionário no norte de Moçambique (Pemba). Atravessou lá a guerra colonial e, depois, quase 20 anos de guerra civil. Faleceu nos últimos dias de maio, aos 88 anos, fora da sua terra. O Irmão João era um homem que falava em verso. Literalmente. Rimava as suas respostas com as do seu interlocutor. Sintonizava. Quem o conheceu sabia da sua arte: amanhar a terra, regar, desbravar capim, fazer nascer couves e alfaces. Numa das primeiras vezes que o encontrei estava, naturalmente, na horta. Sem camisa, magro, calvo, com as patilhas descidas pela face, com a pele enegrecida pelo sol, como que coberto por uma carapaça natural. Indiferente aos salamaleques habituais da presença de um Bispo que também chegava, cumprimentou e continuou agarrado à enxada. Pouco depois, apareceu à mesa dos convivas com a sua camisa coçada pelo uso, dobrada sobre um ombro. Sentou-se, pegou na sua tigela de sopa, juntou-lhe um pouco de tudo o que estava sobre a mesa, remexeu e comeu sem delongas nem cortesias. Não abdicava do direito às férias. Para essa viagem usava o seu único fato. Já cego e paralisado de um dos braços, frutos de um assalto, remetido para Portugal por questões de saúde, dizia: “se não faço nada aqui [Portugal], prefiro não fazer nada na minha terra [Moçambique]”. E cantava “vai trabalhar pelo mundo inteiro, Eu estarei até ao fim contigo. Está na hora, o Senhor me chamou, Senhor aqui estou...”. Assim partiu como viveu: com os pássaros e em nome de Deus.

3. Há 5 anos, um grupo de beneditinos do extraordinário oásis do Mosteiro de Ndanda, Tanzânia, uma mega escola de ofícios, passou por terras da Diocese de Pemba (recordo que esta Diocese é do tamanho de Portugal). Quando passaram em Imbuo (Mueda), local distante do “mundo”, viram umas casas em ruínas: seria ali mesmo que reergueriam uma Missão católica. O padre Witmar, de feitio férreo contrastante com a magreza do corpo, voluntariou-se para reconstruir essa Missão. Em três anos construiu uma grande igreja, ergueu a casa das irmãs missionárias e a escolinha para crianças (com internato). Construiu ainda duas cisternas de 100.000 litros de água, qual mina de ouro. O Pe. Witmar tem 87 anos. Nasceu na Alemanha e é monge beneditino há 63 anos. Fala fluentemente alemão, inglês e kiswahili. Foi missionário na Tanzânia durante 59 anos. Repare-se sobretudo neste “pormenor”: depois dos 80 anos mudou de país, de língua... Vive ainda, com os pássaros e em nome de Deus.

4. Parafraseando o título de um conto de Mia Couto, há embondeiros que sonham pássaros.

Artigo publicado no Suplemento Igreja Viva de 28 de junho de 2018.

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