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21 Abr 2019
Redescobrir a Páscoa retirando as pedras
Homilia no Domingo de Páscoa
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Vivemos esta Semana Santa tomando consciência de que na vida, pessoal e comunitária, existem muitas pedras. São motivo para atemorizar, tropeçar, atirar aos outros. Por outro lado, podem e devem tornar-se pedras que constroem uma sociedade mais humana. Com Cristo vivo, nada nos pode deter. As dificuldades parecem paralisar-nos. É uma ilusão. São, na verdade, circunstância para correr anunciando ao mundo que Cristo está vivo e operante e que, com Ele, uma história nova deve ser anunciada.

Para ser esperança através da alegria de tecermos comunidades acolhedoras, necessitamos de dar outra sensibilidade à nossa vida. Na alegria da manhã de Páscoa recordo três ideias. 

1. “Arrancarei do vosso peito o coração de pedra e dar-vos-ei um coração de carne” (Ez 36, 25).

A sociedade do narcisismo e do consumismo vive marcada pela indiferença e insensibilidade. Contenta-se com algumas relações familiares que se estendem a pequenos grupos. Com a desculpa de que não se quer intrometer na vida dos outros, deixa-se que a História corra sem o envolvimento e compromisso missionários. Assiste-se de fora e fica-se nas lamentações. 

São poucos aqueles que se põem a caminho e, muitas vezes, quando o fazem estão motivados por interesses pessoais, económicos ou políticos. A fé em Cristo ressuscitado provoca a gratuidade e a alegria de gastar a vida pelos outros e pelo bem comum. 

Sim! A Páscoa deve ser oportunidade para substituirmos o coração de pedra por um coração de carne: sensível, aberto, interessado por aqueles que caminham connosco. Este coração de carne é a primeira condição para nos desinstalarmos, sairmos do sofá, deixarmos a varanda da vida e avançarmos com uma sadia inquietação pelo bem da Humanidade. Não basta ser telespectador inerte e crítico. Deixemo-nos vibrar pelas inquietações e problemas de muitos, de perto e de longe. Temos um coração capaz de dar vida ao mundo e não podemos destruir a sua vitalidade.

2. Nesta noite recordo, também, as pedras destinadas a apedrejar a mulher adúltera encontrada em flagrante delito. A sociedade moderna é muito analítica. Está sempre pronta a ver as faltas dos outros. Nunca, como hoje, se viram tantos processos nos tribunais. A comunicação social envereda com facilidade por caminhos de investigação, às vezes de invasão da privacidade, e coloca na praça pública os defeitos e os sinais de corrupção. Nas famílias acumulam-se as ofensas e julga-se sem perdão, chegando à ruptura de laços que deveriam ser eternos. Na vizinhança escrutina-se a vida de quem deveria ser próximo. Nos ambientes de trabalho perde-se a confiança e critica-se o mal que deveria ser corrigido fraternalmente. Tantos sinais de juízo e de condenação que muitas vezes acontecem porque não queremos aceitar as nossas responsabilidades.

É fácil encontrar pedras para atirar aos outros. Com a mulher adúltera, Cristo quis escrever uma história diferente. Quando queremos comunidades acolhedoras estamos a pensar no valor das diferenças e na importância de aceitar as imperfeições alheias para progredir.

3. No túmulo de Jesus colocaram uma pedra, de harmonia com as tradições judaicas, mas também para impedirem que o pudessem roubar. Se tinha havido tanto interesse em eliminar a sua missão profética de testemunhar o amor de Deus pelo mundo, se os fariseus e os chefes da sinagoga tinham encontrado tanto engenho para calar a sua voz que incomodava, seria necessário ter um cuidado particular para que não voltasse a aglutinar multidões. Só que, como havia prometido, com a força de Deus, Ele ressuscitou para permanecer com os Apóstolos por mais quarenta dias e restituir-lhes a coragem de ser seus discípulos. Caminhou com os desanimados e desalentados até Emaús. Quis ficar com eles para experimentarem a força da Sua presença. Era necessário ultrapassar as dúvidas e perplexidades. 

Os discípulos estavam dispersos e sem vontade de se encontrarem para dar continuidade ao Seu projecto. As pedras eram muitas e grandes. A força do Espírito restitui a responsabilidade de uma missão que foi capaz de aguentar e de suportar todas as formas de perseguição, inclusive o martírio. Acabou o medo de o anunciar perante os cenários mais complicados de Jerusalém, Roma e outros lugares. Partiram e construíram, com a sua resiliência, comunidades vivas espalhadas por todo o império romano.

Nas comunidades acontecem rupturas. Criticamos. Atiramos pedras. Não ousamos discernir. Não acontece a Páscoa, com Cristo vivo e operante no meio de muitos que se amam verdadeiramente, e o anúncio fica-se pela proclamação da doutrina quando deveria transparecer a vida de união entre outros. É grande a responsabilidade das nossas comunidades. Outrora bastava a doutrina que se aprendia mecanicamente e que não se sujeitava ao confronto de quem pensa diferente e mostra outros documentos. Contentávamo-nos com tradições, costumes. Bastava alguma organização como em qualquer outra instituição. Hoje não é suficiente. Ou a comunidade, por aquilo que é, anuncia Cristo presente no seu meio ou não é comunidade cristã. A Páscoa reclama este anúncio. 

O Santo Padre fala de “nuvem negra”, de feridas de que se reflectem “sem piedade nas rugas do rosto milenar da nossa mãe e mestra”. Só que nada pode atenuar a responsabilidade da Igreja, nas suas comunidades, de “se renovar, de voltar a sonhar, e reinventar” (n. 101). Sabemos que nunca se “abandona a Mãe quando está ferida” (n. 102). 

No quotidiano das comunidades e da Igreja, são muitas as pedras. Importa aproveitá-las para construir. Sejamos construtores através do diálogo transparente, da correcção fraterna, da verdade nas relações. Gostaria de descortinar uma aurora esplendorosa para o ambiente das nossas comunidades. É cristo vivo e ressuscitado que o exige.

Este é o verdadeiro modo de viver a Páscoa, hoje.

† Jorge Ortiga, Arcebispo Primaz

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