Arquidiocese de Braga -

2 outubro 2020

Vamos ser responsáveis pelos outros

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Mensagem do Arcebispo no Dia da Arquidiocese de Braga.

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O calendário da nossa igreja particular determina que no dia 5 de Outubro celebremos o Dia da Arquidiocese. Escolheu-se este dia por estarmos no início do ano pastoral. Não teremos, este ano, celebrações a nível arciprestal ou arquidiocesano. Tudo acontecerá nas paróquias e com a consciência de que somos Igreja na Arquidiocese de Braga. Queremos reforçar as ideias do Programa Pastoral e abrir-nos aos desafios que juntos temos de interpretar.

1. Tudo indica que teremos um ano diferente. Fugiremos aos esquemas habituais e teremos de reinventar a pastoral. Não cruzamos os braços! Discernimos caminhos novos onde a esperança nos conduzirá a novas aventuras, impensadas até há pouco tempo, mas obrigatórias neste peculiar contexto. Não nos fixemos nas lamentações que obstruem a caminhada. Precisamos de serenidade e de reconher de que algo de novo poderá e deverá acontecer. Este tempo poderá tornar-se Kairós, graça a apontar caminhos audazes e mais evangélicos porque despidos de adereços históricos que poderão deturpar a verdadeira imagem da Igreja para estes tempos da modernidade.

Não é um tempo mau. Não é uma catástrofe. É uma nova oportunidade que Deus nos concede. Abramos os ouvidos e acolhamos o que Ele nos quer sugerir. Em vez de nos deixarmos cair no desalento e ansiedade teremos de nos deixar levar pelo entusiasmo e convicção nas nossas causas. São muitos os desafios perante a imprevisibilidade mas a esperança deve ser superior. A pandemia afectou-nos como Igreja e sociedade. Ela não passou e as previsões vão no sentido de nos acompanhar ainda durante um período não quantificável. Será um ano exigente. 

Vamos trabalhar para uma aposta séria na catequese, com sessões presenciais ou de outro modo, apostando no que as famílias poderão testemunhar e anunciar. Avancemos com a actividade dos movimentos e obras de apostolado e dêmos qualidade ao funcionamento dos diversos serviços diocesanos e paroquiais. Continuemos a apostar no trabalho com os jovens, nomeadamente numa maior integração na caminhada de preparação para as Jornadas Mundiais da Juventude. Dediquemo-nos com entusiasmo à pastoral familiar criando todas as condições para verdadeiras experiências de igrejas domésticas.

Até agora tem havido compreensão e adaptação a todos os condicionalismos, nomeadamente no cumprimento escrupuloso das medidas de higienização e distanciamento. Vamos prestar ainda maior atenção à prevenção, adoptando comportamentos responsáveis no relacionamento social, e trabalhemos, como algo que também pertence à evangelização, para sensibilizar, dentro da Igreja e nas actividades, para que a partir das comunidades se cumpram as orientações que poderão evitar o contágio. A pandemia exige mais solidariedade e solicitude. É um investimento que pede a convergência de todos os esforços acima de qualquer interesse ou vontade pessoais.

2. Neste início de ano pastoral, gostaria de lembrar que o cristianismo, o Evangelho, não é um manual de procedimentos com um conjunto de prescrições e, talvez mais ainda, de proibições. Talvez o tenhamos apresentado nesta perspectiva moralista. Torna-se imperioso centrar a originalidade da nossa vocação como encontro amoroso com Cristo, expresso numa intensa e assumida adesão ao seu estilo de vida e realização do seu projecto. São João oferece-nos uma simbologia. “Eu sou a videira e vós os ramos. Quem fica unido a Mim, e Eu a ele, dará muito fruto, porque sem Mim não podeis fazer nada” (Jo 15,5). Unidos a Ele teremos de ser o que Ele é. Enxertados em Cristo temos a mesma vida e orgulhamo-nos de um estilo de vida inconfundível e diferenciador. 

Nunca reflectiremos o suficiente sobre o modo como S. João define categoricamente. “Deus é amor, quem permanece no amor permanece em Deus” (1 Jo 4,16). Tudo é muito lógico. O discípulo de Cristo é aquele que permanece no amor para estar em Deus. Para ele o amor não é um factor secundário ou aleatório que usa ocasionalmente. Torna-se ou deve tornar-se constitutivo da sua vida. É caminho obrigatório a percorrer em todos os momentos. A vida só se compreende amando.

Como Igreja Arquidiocesana temos vindo a discernir o que significa ser discípulo missionário. Realçamos a importância da adesão a Cristo e sublinhamos a missão de ser semeadores da esperança. Iniciaremos, agora, um triénio dedicado à caridade com todas as implicações que possa trazer à vida pessoal dos cristãos e das comunidades. Não se trata de uma ruptura nas opções pastorais. Vemo-nos convidados a prosseguir o caminho do discípulo missionário, sempre no intuito de renovar a Igreja. A redescoberta da caridade reservar-nos-à muitas surpresas na relação com Cristo e com os outros. Devemos ser amor e oferecer amor. O Papa Francisco propõe-nos a palavra “transbordamento” como horizonte paradigmático. Possuídos pelo amor devemos mostrar amor. 

3. Queremos renovar a Igreja com a sinodalidade. 

Em Deus faço parte de uma única família. Somos obras do amor criador de Deus. Todos e tudo. Por isso, a vida é uma caminhada em comum. Sinodalidade significa este identificar-se com todos, reconhecer-se como família com sonhos e projectos comuns. Somos corpo que deve crescer como tal. Daí que a vida deve ser, como consequência, delineada em projectos onde todos estão envolvidos.

Urge discernir os melhores caminhos, pensando juntos e chegando em sintonia a decisões. Há muitos lugares onde isto pode acontecer. Querendo, mais uma vez, sublinhar a importância dos Conselhos Paroquiais Pastorais, cito um documento da Santa Sé. A renovação passa inequivocamente por aqui. Não tenho dúvidas. “Longe de ser um simples organismo burocrático o Conselho Pastoral coloca em destaque e realiza a centralidade do Povo de Deus, como sujeito e protagonista ativo da missão evangelizadora, em virtude do facto que cada fiel recebeu os dons do Espírito”. “É compromisso do Conselho Pastoral estudar, examinar tudo isto que concerne às atividades pastorais e propor, então, conclusões práticas, a fim de promover a conformidade da vida e da ação do Povo de Deus com o Evangelho” (A Conversão Pastoral, 110). 

4. Queremos ser Igreja Samaritana

Da caridade passamos à sinodalidade e, porque caminhamos juntos, teremos de reconhecer toda e qualquer pessoa como Filho de Deus e irmão de todos. Na caminhada conjunta não podemos permitir a indiferença ou o alheamento. A vida dos outros pertence-nos e pede-nos solicitude e atenção. O cristão não pode aceitar a marginalidade ou a exclusão social. Apercebe-se do sofrimento alheio, material e espiritual, e deixa-se tocar compassivamente para pegar nele, e sobretudo encontrar soluções de um modo interpessoal ou através das instituições a que a comunidade dá vida.

O Bom Samaritano é uma parábola repleta de interpelações. A liturgia também nos ajuda a compreender. “Na sua vida mortal, Ele passou fazendo o bem e socorrendo todos os que eram prisioneiros do mal. Ainda hoje, como bom samaritano, vem ao encontro de todos os homens atribulados no corpo ou no espírito e derrama sobre as suas feridas o óleo da consolação e o vinho da esperança” (Prefácio Comum VIII).

Também a última encíclica do Papa, assinada ontem em Assis, falando da fraternidade e amizade social, irá ajudar-nos a ver caminhos novos de solidariedade e compromisso cristão. Espero que seja lida por todos. A fraternidade e amizade social deverá ser vivida por todos.

Neste ano, por onde deverá andar a nossa fé? Pelos caminhos da sinodalidade, sendo samaritanos, para transbordar amor para que o mundo acredite. O samaritano encheu-se de compaixão e agiu. É esse o nosso caminho. Juntos vamos ser responsáveis pelos outros.

 

† Jorge Ortiga, Arcebispo Primaz

 


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