Arquidiocese de Braga -

8 junho 2022

“O futuro do catolicismo? Está em não em voltar ao passado”

Fotografia

DACS com La Croix International

Entrevista com a principal socióloga da religião de França, cujo livro recente analisa a implosão da Igreja no seu país.

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Danièle Hervieu-Léger, a principal socióloga da religião na França, está convencida de que a pandemia de coronavírus e o relatório devastador do ano passado sobre o abuso sexual do clero na Igreja francesa deram uma grande contribuição para o colapso contínuo do catolicismo no seu país natal.

Hervieu-Léger escreveu recentemente “Vers l'implosion? Entretiens sur le présent et l'avenir du catholicisme” (Para a implosão? Discussões sobre o presente e o futuro do catolicismo), uma longa conversa com outro sociólogo, Jean-Louis Schlegel, sobre o presente e o futuro do catolicismo.

Danièle falou mais sobre o que tentou transmitir no livro com Clémence Houdaille, do La Croix.

 

A erupção do Covid e o confinamento que o acompanhou levaram a uma proliferação de iniciativas espontâneas entre os católicos na tentativa de manter uma vida religiosa. Qual é a sua análise dessas iniciativas?

Vimos dois tipos principais de iniciativas. Algumas ocorreram por meios virtuais. Este tem sido um recurso importante.

Por exemplo, era possível transmitir funerais e, nessas situações muito angustiantes para famílias que não podiam estar juntas em redor do seu ente querido falecido, isso era consolador.

Ao mesmo tempo, isso por vezes deu origem a uma extraordinária encenação clerical, com jovens padres 2.0, muito hábeis na abordagem digital, transmitindo a missa pela Internet.

Isso foi capaz de tocar os fiéis e dar a sensação de que, graças a esses meios, se podia entrar em contacto com os outros.

Mas também deu origem a problemas imprevistos, com a imagem do padre a celebrar sozinho numa igreja vazia, e levantou questões sobre a realidade ou virtualidade de uma comunidade, sobre a questão da centralidade do corpo físico na vida litúrgica.

O segundo registo é o da multiplicidade de pequenas iniciativas: encontros de oração e discussões em âmbito doméstico, bem como manifestações de solidariedade, que às vezes passavam despercebidas.

Um certo número de católicos, que não são necessariamente pilares da sacristia, mostrou-se muito activo. Alguns formalizaram as razões do seu compromisso de solidariedade como uma implementação do sacramento do irmão e da irmã.

 

Hoje, a suspensão das Missas parece uma coisa que aconteceu há muito tempo. O que resta dessas iniciativas?

O certo é que nem todos voltaram à Missa. E o que aconteceu durante os confinamentos demonstrou, ao contrário, a fragilidade do vínculo paroquial, o carácter abstracto das relações ordinárias durante a Missa.

Recebi testemunhos segundo os quais muitos fiéis decidiram tomar conta de si mesmos, tendo descoberto que possuíam uma capacidade autónoma de socialização religiosa, que agora está no modo afinidade. Já a organização paroquial, ancorada na figura do clérigo, é territorial: reúne fiéis que não se escolhem uns aos outros.

Além disso, está a surgir uma prática alternativa, com visitas a importantes locais religiosos como santuários e mosteiros. Estamos a ver o desenvolvimento de uma forma de sociabilidade suave, opcional e à la carte.

 

Essas convulsões sociais são sustentáveis?

É uma mudança completa que pode ocorrer com a passagem de uma sociabilidade territorial para uma sociabilidade por afinidade. Agora, tudo depende da forma como a instituição leva esse fenómeno em consideração.

O que é certo é que não pode haver um regresso à norma do passado, porque não só há um colapso demográfico do clero, mas também uma erosão dos voluntários paroquiais, que já estava em andamento e foi acelerado pela COVID-19.

O confinamento foi severo para as paróquias rurais. Voluntários na casa dos oitenta anos não voltaram ao serviço com o fim dos confinamentos. Os hábitos perdem-se muito rapidamente e a transmissão para a geração mais jovem, que está ausente, não ocorreu.

 

Entrevista de Clémence Houdaille, publicada no La Croix International a 7 de Junho de 2022.