Arquidiocese de Braga -

15 dezembro 2025

Presépio de Priscos quer despertar consciência coletiva para a deficiência

Fotografia DM

DM - Carla Esteves

D. José Cordeiro defende acolhimento da diferença e reinserção dos reclusos

O emblemático Presépio ao Vivo de Priscos , um dos mais autênticos presépios vivos da Europa, abriu, ontem, as portas para a sua XIX edição, que, à semelhança dos anos anteriores, aguarda milhares de visitantes oriundos de todo o país e da vizinha Espanha. Mensagem viva de fé e humanidade, em 2025, Priscos transporta consigo uma reflexão profunda sobre a temática da “Deficiência e Superação”, pelo que, segundo o seu grande mentor, padre João Torres, «mais do que uma representação, esta edição pretende ser um apelo à consciência coletiva».

«Quem deixamos à margem quando dizemos que celebramos o Natal?», questionou o pároco de Priscos, acrescentando que «esta é a pergunta simples e exigente que o Presépio de Priscos coloca este ano, com o objetivo de dar visibilidade a pessoas e a famílias que vivem a deficiência não como limite de valor, mas como desafio diário à dignidade, à inclusão, à igualdade de oportunidades».

«Há mães e pais que vivem entre o amor imenso e o cansaço diário. Há jovens cheios de sonhos, à espera de oportunidades que nunca chegam. Há famílias que lutam contra o esquecimento de apoios, a ausência de respostas, a falta de estruturas de acompanhamento e de um futuro garantido. Há pessoas com deficiência que não pedem piedade, mas sim dignidade. Não pedem exceções, pedem pertença», afirmou o fundador do Presépio.

Segundo o sacerdote «esta edição é um grito manso, que pede uma inclusão real» e «um convite a passar do discurso à presença».

O padre João Torres revelou que precisamente com o intuito de dar «um nome, um rosto e uma presença» ao Presépio, foi convidada a família do Diogo, um jovem de 20 anos, que nasceu com ataxia.

Ainda no domínio da inclusão, o fundador chamou a atenção para o facto da abertura desta XIX edição decorrer no dia em que se celebra o Jubileu dos Reclusos, facto que merece especial celebração no Presépio de Priscos, um projeto único no país onde, ao longo de mais de dez anos, vêm trabalhando cerca de 75 reclusos.

«Estes reclusos viajam de transportes públicos com o patrocínio da Câmara Municipal. Estão cá durante o dia, chegam cá cerca das 8h30 e depois partem por volta das 5h da tarde. São remunerados, têm seguro, têm todas as condições de trabalho, almoçam aqui. E muitos deles voltaram à vida, temos uma taxa de sucesso de cerca de 93%», explicou.

Sustentando que o Presépio de Priscos «vai sendo construído com as mãos que Deus nos vai dando», o sacerdote afirmou que uma das suas missões  é precisamente ajudar mais pessoas a entrarem na sociedade com uma liberdade plena».

Este ano o Presépio de Priscos conta com cerca de 650 figurantes de todas as freguesias de Braga e dos concelhos de Barcelos, de Famalicão, de Guimarães e de outros pontos do país.

Os visitantes crescem de ano para ano e só ontem eram aguardados nesta freguesia 47 grupos organizados, alguns deles com mais de 200 pessoas, incluindo e cerca de 15 grupos vindos de Espanha.

«O mercado espanhol gosta muito deste Presépio. Lembro-me que no ano passado perguntei a um senhor de Vigo, que esteve aqui a visitar, a razão de vir cá e ele respondeu-me que em Vigo, o Presépio é movido a eletricidade, mas em Priscos é movido a coração e mãos», concluiu.

Arcebispo Primaz apela à integração por parte da Igreja, da política, das empresas e sociedade 

O Arcebispo de Braga, D. José Cordeiro, destacou, ontem o papel que os reclusos vêm desempenhando na construção do Presépio de Priscos e salientou o facto de se celebrar neste dia o Jubileu dos Reclusos, neste Ano Santo da Esperança, o que  representa «uma força simbólica muito grande».

«Este Presépio é construído pelas pessoas, para as pessoas, mas sobretudo é construído por aquelas que são invisíveis, que são os presos, que ao longo dos anos aqui passaram, nestas 19 edições», afirmou, felicitando o padre João Torres, coordenador da Pastoral Penitenciária da Arquidiocese de Braga pelo seu trabalho.

O Arcebispo Metropolita enalteceu ainda o facto de em cada ano, haver «uma chamada de atenção para agitar as águas e mover as consciências». «Agradecemos também à família Faria por se ter disponibilizado a estar connosco e apresentar que as pessoas com deficiência são iguais a nós e são pessoas com dignidade, a quem nós temos de integrar, acolher e acompanhar», afirmou.

D. José Cordeiro defendeu que o acolhimento deve ser efetuado «por todos, cada um, consoante a sua responsabilidade, a Igreja, a sociedade, a política, sobretudo o mundo das empresas, do trabalho, assim como os ex-presidiários na sua reinserção social».

«Quando Deus assumiu a carne humana, que é disso que se trata no Natal, assumiu todas as condições e toda a condição humana. E por isso, vir aqui a Priscos é tocar esse Mistério ao vivo», alertou.

Rejeitando que este Presépio seja encarado apenas como «mais um elemento para decorar a quadra Natalícia», o Prelado lembrou que «o Presépio de Priscos é construído ao longo de todo o ano» e «está no caminho de Páscoa porque só à luz da Páscoa nós podemos entender o mistério que aqui se passa. É a tal possibilidade do impossível».

«E aqui em Priscos vê-se aquilo que este ano nós propusemos para toda a Arquidiocese: Juntos sermos servidores criativos, neste caminho de Páscoa,  no qual o Natal resplandece como esta luz que ilumina todas as realidades humanas, não deixando nenhuma de fora»,  advertiu.